sexta-feira, 5 de julho de 2019

Três hábitos simples para aprimorar seu pensamento crítico

Helen Lee Bouygues

Há alguns anos, um CEO me garantiu que sua empresa era líder de mercado. “Os clientes não vão nos trocar pela concorrência”, acrescentou. “A mudança sai caro para eles.” Em poucas semanas, a gigante da indústria de transformação Procter & Gamble decidiu não renovar seu contrato com a empresa. O CEO ficou chocado — mas ele não deveria ter ficado tão surpreso.

Por mais de 20 anos ajudei empresas em dificuldades. Às vezes elas me procuram por terem sido mal administradas. Outras, por não terem acompanhado as mudanças tecnológicas. Em alguns casos, os membros do alto escalão foram simplesmente negligentes. Contudo, na minha experiência, esses problemas empresariais tinham uma causa fundamental em comum: a falta de pensamento crítico.
Muitos líderes empresariais simplesmente não têm se detido nas questões mais urgentes, dedicando tempo para avaliar um tema de todos os ângulos. Eles muitas vezes saltam para a primeira conclusão, sejam quais forem os indícios. Ainda pior, os líderes do C-level escolherão apenas os indícios que apoiem suas crenças a priori. A falta de metacognição — ou pensar sobre o pensamento — também é um grande motivador, levando as pessoas a terem excesso de confiança.
A boa notícia é que o pensamento crítico é uma habilidade que pode ser aprendida. Para ajudar as pessoas a melhorar, recentemente fundei a organização sem fins lucrativos Reboot Foundation. Com base em minha experiência pessoal, e a partir do trabalho de nossos pesquisadores, reuni três dicas simples que você pode seguir para melhorar suas habilidades de pensamento crítico:
1. Questione os pressupostos
2. Pondere de forma lógica
3. Diversifique o pensamento
No entanto, você pode estar pensando: “Eu já faço isso”. E provavelmente está correto, mas não da forma mais calculada e completa possível. Cultivar esses três hábitos mentais fundamentais ajuda muito a aprimorar essa habilidade cada vez mais desejada no mercado de trabalho.
Questione os pressupostos
Quando trabalho para transformar uma organização, começo a questionar os pressupostos da empresa. Certa vez, visitei dezenas de lojas de uma cadeia de varejo, fingindo ser uma consumidora. Logo descobri que a empresa havia pressuposto que seus clientes tinham muito mais renda disponível do que realmente possuíam. Essa crença errônea levou a empresa cobrar caro demais por suas roupas. Ela teria lucrado milhões a mais a cada ano se tivesse vendido camisas e calças a preços mais acessíveis.
Claro, é difícil questionar tudo. Imagine passar o dia se perguntando: o céu é realmente azul? E se a pessoa ao meu lado não for minha colega, mas sua irmã gêmea? Como posso saber que a economia não vai implodir amanhã?
O primeiro passo para questionar pressupostos, então, é descobrir quando questioná-los. Uma postura questionadora é particularmente útil quando os riscos são altos.
Se você estiver em uma discussão sobre uma estratégia de longo prazo da empresa na qual anos de esforços e despesas serão investidos, não deixe de fazer perguntas básicas sobre suas convicções: como você sabe que os negócios vão crescer? O que as pesquisas dizem sobre suas expectativas em relação ao futuro do mercado? Você dedicou tempo suficiente para se colocar no lugar dos seus clientes como um “cliente oculto”?
Outra forma de questionar seus pressupostos é considerar alternativas. Você pode se perguntar: e se nossos clientes mudarem? E se nossos fornecedores falirem? Esse tipo de pergunta pode oferecer novas e importantes perspectivas que lhe ajudam a aprimorar seu raciocínio.

Pondere de forma lógica
Anos atrás, assumi a tarefa de recuperar a divisão de uma grande empresa de lingerie. O crescimento de uma de suas principais linhas de produtos vinha declinando há anos. Ninguém conseguia descobrir o porquê.
Descobrimos que a empresa havia cometido o erro de raciocínio da generalização excessiva, chegando a uma conclusão abrangente baseada em evidências limitadas ou insuficientes. Ou seja, a empresa acreditava que todos os seus clientes internacionais tinham preferências semelhantes. Por isso, enviava os mesmos modelos de sutiãs para todas as lojas da Europa.
Quando minha equipe começou a conversar com colaboradores e consumidores, percebeu que clientes em diferentes países relataram gostos e preferências bastante distintas. As inglesas, por exemplo, tinham a tendência a comprar sutiãs rendados de cores vivas. As italianas preferiam sutiãs bege, sem renda. E as norte-americanas eram as consumidoras líderes mundiais de sutiãs esportivos.
Para essa empresa de lingerie, aprimorar o raciocínio ajudou a melhorar substancialmente sua receita. A boa notícia é que a prática formal da lógica remonta há pelo menos dois mil anos, a Aristóteles. Ao longo desses dois milênios, a lógica demonstrou seu mérito ao chegar a conclusões sólidas.
Então, na sua empresa, preste muita atenção à “cadeia” lógica construída por um argumento particular. Pergunte-se: o argumento é apoiado em todos os pontos pelas evidências? Todas as evidências, individualmente, sustentam-se mutuamente para resultar em uma conclusão sólida?
Ter consciência de falácias comuns também pode levar você a pensar de forma mais lógica. Por exemplo, as pessoas frequentemente se envolvem no que é conhecido como pensamento post hoc. Nessa falácia, as pessoas acreditam que “porque o evento Y seguiu o evento X, o evento Y deve ter sido causado pelo evento X”.
Assim, por exemplo, um gestor pode acreditar que seus vendedores acumulam mais vendas na primavera porque foram estimulados pelos discursos motivacionais proferidos na conferência anual de vendas em fevereiro — mas até que esse pressuposto seja testado, não há como o gestor saber se sua hipótese está correta.

Busque a diversidade de pensamento e colaboração
Durante anos, fui a única sócia mulher na equipe de transformação da McKinsey. E hoje, por mais que eu atue em diversos conselhos corporativos, normalmente sou a única asiática e a única representante do sexo feminino nas reuniões.
Em virtude da minha trajetória e das minhas experiências de vida, costumo ver as coisas de maneira diferente das pessoas ao meu redor. Isso muitas vezes jogou a meu favor. No entanto, também não sou imune à identidade de grupo. Quando estou rodeada de pessoas semelhantes a mim por qualquer motivo — idade, orientação política ou religião — procuro obter diferentes pontos de vista, o que aprimora meu pensamento.
É natural que as pessoas se agrupem com outras que pensam ou agem da mesma maneira. Isso acontece especialmente na internet, onde é fácil encontrar um nicho cultural específico. Os algoritmos das mídias sociais podem restringir ainda mais nossas perspectivas, mostrando apenas notícias que se ajustam às nossas crenças individuais.
E isso é um problema. Se todas as pessoas dos nossos círculos sociais pensam como nós, tornamo-nos mais rígidos em nosso pensamento e menos propensos a mudar nossas crenças com base em novas informações. Na verdade, as pesquisas mostram que, quanto mais as pessoas ouvem outras que compartilham pontos de vista como os seus, mais polarizadas se tornam suas opiniões.
É fundamental sair da sua bolha pessoal. Vá aos poucos. Se você trabalha com contabilidade, faça amizade com pessoas do marketing. Se você sempre for almoçar com a equipe sênior, vá a um jogo de futebol com colegas de outro escalão. Treinar-se dessa maneira ajudará a fugir do seu pensamento habitual e obter percepções mais ricas.
Em contextos de equipe, dê às pessoas a oportunidade de expressar suas opiniões de forma independente, sem a influência do grupo. Quando peço conselhos, por exemplo, normalmente omito minhas próprias preferências e peço aos membros da equipe que me enviem suas opiniões em notas separadas. Essa tática ajuda a impedir que as pessoas caiam presas do pensamento de grupo.
Embora essas táticas simples possam parecer fáceis – ou mesmo óbvias – elas são raras na prática, particularmente no mundo dos negócios, e muitas empresas não dedicam tempo para se envolver em formas robustas de raciocínio. No entanto, o importante trabalho do pensamento crítico compensa. Embora a sorte desempenhe um papel — ora menor, ora maior — nos êxitos de uma empresa, as vitórias mais importantes nos negócios são obtidas pensando-se de maneira inteligente.

Helen Lee Bouygues é presidente da Reboot Foundation, sediada em Paris. Ex-sócia da McKinsey & Company, atuou como CEO, CFO e COO interina em mais de uma dezena de empresas .


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